segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Uma certa dose de "depressivo" não faz mal a ninguém

Não é recente a designação “geração Prozac” para a turma que viu nos antidepressivos uma forma de tornar a vida mais feliz. A depressão é um dos males destes últimos anos, e psicólogos, médicos, e pacientes não hesitam em partir para esta solução quase sempre rápida e eficaz. Quem ainda não usou deste artifício para aguentar a pressão que atire a primeira pedra. A crítica subentendida no termo cunhado lá pelos anos 1990 remete a uma questão mais ampla que segue cada vez mais atual. Somos uma sociedade que não suporta melancolia, tristeza, negativismo. Todos temos que viver em um comercial de margarina, sorridentes, felizes, saudáveis, sem problemas aparentes. Depois da invenção do orkut, então... Há uma competição pra ver quem tem o álbum mais bonito, cheio de fotos alegres, em lugares esplêndidos, com o maior número de amigos sorridentes. Todo mundo quer parecer ser o mais popular, ter a família mais perfeita ou viver o romance mais cor-de-rosa.
Enfim, mas o que isto tudo tem a ver com o Prozac mesmo? Que fique claro que sou muito a favor do tratamento de qualquer doença, inclusive já me socorri de alguma outra droga (lícita), certamente filha deste pai dos antideprê. A crítica é a esta nossa ojeriza ao lado mais lúgubre da vida. Eu mesma, quando tive diagnóstico de depressão, foi por conta desta fuga da tristeza. Perdi meu pai e não tive coragem de encarar o luto. Fiquei meses fingindo que tudo poderia seguir normalmente. Resultado: terapia e antidepressivo. Deu certo. Mas não teria sido mais fácil ter encarado o luto de frente? Certos estavam nossos antepassados ao dedicar algum tempo para o convívio com a dor. Aí que está! Hoje temos repulsa a dor, fugimos dela como o diabo foge da cruz. Ninguém quer sentir-se e muito menos parecer triste, ninguém quer ser flagrado na rua com cara de choro. Não suportamos uma música lenta, calma, dolorida, que nos coloque em contato com nossos dramas. Queremos é carnaval o ano todo, nos entorpecemos de álcool aos finais de semana, ouvimos música barulhenta e agitada, tudo isto pra que a alegria vença a tristeza. Que bom que podemos contar com esta profilaxia também. Mas, e de tanto espantar a melancolia, o que acontece? Não seria isto jogar a sujeira pra debaixo do tapete? Uma hora ela vai aparecer... Pode ser através daquele vazio inexplicável, mesmo parecendo que temos tudo pra estarmos felizes. Pode ser aquela dor no peito, aquela raiva, aquele stress sem explicação.
Outro motivo pra questionar esta nossa mania de não querer enfrentar o sofrimento com coragem, olhando de frente nossas dores, é que existe um lado bom nesse estado mais “depressivo” da existência. Li um texto dia desses de um filósofo recomendando doses de depressivo como uma forma de melhorar a vida das pessoas. Segundo sua teoria, uma depressão muitas vezes pode ser fundamental na vida de alguém. Um emprego que nos deixa infeliz, um relacionamento que já se esgotou... Quanta gente só teve coragem de mudar uma situação como estas depois de passar por um estado depressivo? Ou alguém já pensou que seria possível existir filosofia, genialidade, sabedoria, em um mundo em que não existisse depressão, melancolia, silêncio e introspecção?
Luis Fernando Veríssimo andou escrevendo sobre o quanto povos de países frios, em que o fogo agrega e leva a pensar, ao contrário de locais em que o calor é proporcionado pelo sol diretamente, são mais afeitos a criação artística, ao pensamento filosófico, etc. Como não consigo pensar no verão, e no inverno me torno mais afeita a atividades de maior exigência intelectual, sou obrigada a concordar. Mais um argumento pra que passemos a aceitar o estado depressivo não só como algo natural, mas como essencial em dados momentos. Arrisco a dizer que com a idade, tendemos a encarar melhor esta faceta da vida, e até provocamos momentos dor-de-cotovelo como forma de elevar nossa percepção e autoconhecimento. Percebo isto em minhas preferências musicais, escolhas de filmes, que vêm mudando nos últimos tempos. Passei a gostar de ritmos mais melancólicos, como jazz e blues, opto por filmes mais densos, tenho maior simpatia pelo inverno do que quando era mais jovem, me encanto com locais de clima introspectivo, e estou lidando melhor com minhas fraquezas e medos.
Não me entendam mal, isto aqui não é uma ode à tristeza, que quero mais que ela vá embora. Mas é um constato de que em alguns momentos somos obrigados a encará-la, e do quanto é importante sentí-la, trabalhá-la. Ela pode, sim, ser positiva. Porque, quando ela vem, e a gente finge que ela não está ali, a coisa só tende a estourar mais na frente. E aí, só mesmo tomando um antidepressivo...

2 comentários:

Unknown disse...

Olá querida amiga !
Saiba que eu te amo muito e eu estou muito feliz pelo teu amadurecimento em todos os sentidos. Agora precisa escutar musica clássica e uma pausa para a meditação.O conhecimento e a inteligência são davivas que carrega nesta mente brilhante.Agora já está na hora de ver que tem algo mais que te espera ! Busque a verdade, a verdade da tua existência e saiba que se bater a porta se abrirá.
Grande abraço.

Luciana Carvalho disse...

Nossa, me arrepiei... Tenho suspeitas sobre sua identidade, mas estou na dúvida.
Obrigada!