Hoje pela manhã nossa aula do Mestrado foi substituída pela palestra do repórter Carlos Wagner, que está divulgando seu novo livro contando a história dos 45 anos da Zero Hora. Tudo bem que era um evento institucional, do grupo RBS, ou seja, com o objetivo de engrandecer o jornal e o trabalho do repórter. Mas, a situação não tira o mérito da visita de Wagner, um daqueles dinossauros da classe que no auge de seus 58 anos de vida esbanja tesão pelo jornalismo, especialmente o investigativo, que é o que faz, e muito bem. A maioria do público era formada por estudantes da graduação, tanto dos primeiros semestres quanto dos períodos mais avançados do curso. Conheci Carlos Wagner no final de 1997, quando acompanhei uma repórter da Rádio Gaúcha (eu fazia um estágio lá na época) em uma cobertura policial no município de Guaíba, na Grande Porto Alegre. Ele, claro, já era referência na área. Devo tê-lo visto outras vezes de passada. Hoje foi legal ouví-lo falar sobre questões como as características fundamentais para a formação de um bom jornalista, futuro do jornal, transformações tecnológicas, relação mercado-academia. Não fosse seu jeitão despachado, sua fala cheia de palavrões e a forma descontraída com que aborda os assuntos, sua presunção e vaidade seriam irritantes. É bonito ver a paixão pelo jornalismo em uma pessoa que está há tanto tempo na ativa, mas ao mesmo tempo a gente vê o quanto o jornalista se ilude para acreditar no que está fazendo. O jornalista se acha capaz de transformar o mundo, pensa que "forma opinião", que está cooperando com o civismo, "colocando gente na cadeia". Pensa que é justiceiro, policial, super-herói. Sinto muito, mas pra mim o jornalista, por mais nobre que seja nossa atividade, nada mais faz do que construir discursos sobre o real. Seria lindo se pudéssemos cumprir pelo jornalismo a promessa moderna de emancipação do sujeito da Modernidade. Podemos ajudar, claro, mas do jeito como é feito, está longe de promover realmente a democracia, como aliás as demais instituições que teriam que sustentá-la e não o fazem. De qualquer forma, essa pretensão do jornalista é que o faz ir adiante e prestar um bom serviço, desde que ele tenha de base uma boa formação moral, ética. Para a gurizada que está ingressando na profissão, Wagner talvez tenha assustado um pouco - falem pelo menos mais uma língua, saibam História, leiam os clássicos da Literatura e da Filosofia. Não precisa saber escrever nem usar parafernália ténica. A segunda parte faz todo o sentido! Não acho que o jornalista tenha que escrever como um Machado de Assis, mas dominar as regras básicas da língua é fundamental.
Eu, particularmente, sempre defendi a formação que tive na universidade federal pela solidez do ensino teórico. Não tínhamos bons laboratórios de foto ou bons estúdios de TV e Rádio, mas tínhamos pensamento. Aprender a mexer em botõezinhos se faz em poucas horas e o mercado se encarrega. Além do que a tecnologia está mudando muito rapidamente e é impossível que a universidade acompanhe esse ritmo. Agora, uma formação para a vida é que faz um bom entrevistador, alguém que entende a sociedade em sua complexidade e que saberá ir atrás das informações com competência. Isso sim faz um bom repórter! Quanto ao futuro do jornalismo, Wagner mostrou estar antenado às transformações operadas com as novas tecnologia da comunicação. Alinhado com o que comentei aqui em outro texto, quando falava de Wolton, o jornalista de ZH defendeu que a disseminação de espaços informativos, as redes sociais, as micromídias, tecnologias móveis, blogs, jornalismo colaborativo etc ao invés de levarem ao fim da profissão de jornalista estão a exigir cada vez mais competência desses profissionais, que teriam de se relegitimar na condição de mediadores através da competência (daí a importância daquela formação sólida comentada acima). Com relação ao futuro do jornal, foi taxativo - pouco importa em que veículo ou meio a informação será repassada. Seja no computador ou no celular, a apuração da notícia, que é a base do trabalho jornalístico, continuará sendo necessária. Surpreendeu sua avaliação de qual seria o meio do futuro - o rádio, pelo seu alcance, penetrabilidade, facilidade de acesso e relação custo-benefício. Mas, o rádio terá de se reciclar, assim como o jornal, que se tornará mais analítico.
2 comentários:
bom saber como foi. infelizmente não pude ir. estava fazendo um trabalho. valeu, abraço.
Ótimo texto, Luciana! Construir discursos sobre o real é uma definição interessante do fazer jornalístico. Antes eu acreditava que o jornalismo poderia ser uma função social, poderia atuar na transformação da sociedade. Mas agora eu não sei mais. Estou cética como o professor Rondom. Gostei da fala do Wagner, mas acho que ele deu algumas respostas bem evasivas a certas perguntas feitas pelos alunos. Algumas vezes senti um certo desdém no tratamento dele a alguns questionamentos. Ele não soube responder ao Rondom porque os grandes jornais dão sempre a mesma versão do fato, ou seja, não procuram outras fontes. ELe defendeu o jornalismo investigativo, mas disse que dar outras versões do fato compete a imprensa alternativa. Foi bem como o Rondom falou: na grande mídia não há muitas opções como se apregoa. Mas, foi válido. Também vou falar da visita dele em post que pretendo publicar na quinta-feira.
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