Não moro mais em São Gabriel, mas visito seguidamente a minha terra natal, pela qual tenho muito carinho e apreço. Minha mãe, meu irmão, os avós e o pai da minha filha, meus parentes mais chegados e grandes amigos moram na cidade. Por isso, tenho motivos para desejar que nada de ruim aconteça por lá. Assim, fiquei preocupada com o pânico que tomou conta do município após a divulgação da suspeita de que gabrielenses teriam sido contaminados pelo vírus da popularmente conhecida gripe suína (Influenza A, vírus H1N1, seja lá o termo correto que for). Alguns casos foram confirmados, o que aumentou a tensão entre os moradores. Mas, o que me deixou surpresa em toda a cobertura da mídia sobre o caso foi a postura adotada pelas autoridades de saúde e a administração local. Primeiro porque antes mesmo da confirmação do primeiro caso, foi decretado estado de emergência pela prefeitura. Segundo, porque os outros casos "suspeitos" de contaminação, foram - em minha modesta opinião - precipitadamente classificados como confirmados, pelo simples fato de que as pessoas com sintomas semelhantes tiveram contato com a menina que voltou da Argentina portando o vírus. Nunca vi, em dez anos de atividade jornalística, esse tipo de conduta por parte de autoridades de saúde. O protocolo seguido pelo bom senso pede que em último caso se forme uma sensação de pânico entre a população. O decreto baixado pelo prefeito de São Gabriel proíbe aglomerações de pessoas até ordem contrária. O argumento de que é melhor pecar pelo excesso do que pela omissão é compreensível, mas não justifica tamanho alarde. A coisa mais bizarra que vi foi o padre tendo que dar explicações aos técnicos do setor de Vigilância Epidemiológica (até a Brigada teria ido à igreja) por ter "desobedecido" o decreto e realizado a missa habitual. Ele se defendeu dizendo que mandaria as noivas casarem na prefeitura. A mensagem é clara: o mundo e a vida das pessoas não podem parar simplesmente porque um decreto assim determina. Surreal imaginar que o maior supermercado da cidade atende de portas fechadas, deixando entrar os clientes aos poucos, para evitar que muitos respirem o mesmo ar. Os bancos com filas do lado de fora, cumprindo a determinação municipal. Festas canceladas, bares às moscas. Nas ruas, as pessoas com máscaras, se esquivando umas das outras. Sou a favor das medidas de prevenção, mas penso que a forma como o poder público se manifestou nesse momento foi descabida. Tanto que recebeu críticas do Ministério da Saúde e do Governo do Estado. Não que isso tire a razão de quem acha que fez o certo, mas quem tem bom senso percebe o tom de desespero e exagero nisso tudo. Imaginem se nos lugares do mundo em que houve o maior número de vítimas a reação tivesse sido essa. Aeroportos estariam fechados, guetos para isolar as pessoas doentes teriam sido construídos, nos moldes do que se fazia antigamente como os doentes de tuberculose e os portadores de hanseníase (lembram das aldeias de leprosos?). A saúde evoluiu, a ciência se reinventa diariamente, mas a mentalidade do corolenismo da fronteira gaúcha não se deixa transformar. Em uma matéria de jornal, o secretário da saúde disse que iriam verificar os acessos ao município. Só o que falta é fecharem as porteiras da cidade, ou colocarem muros para evitar a entrada do vírus. Ou então adotarem o mesmo tipo de defesa que se fez quando da entrada do MST. Seria engraçado ver os defensores da ordem e do direito à propriedade empunhando bandeiras bradando "esta terra tem dono" para expulsar o vírus da gripe.
Brincadeiras e ironias à parte, não estou falando sozinha. Nesta matéria aqui, um especialista diz à agência RBS por que não há motivo para pânico.
11 comentários:
Acredito que o pânico das autoridades e dos moradores de São Gabriel foram inflamados ainda mais pelo alarde exagerado que a mídia vem fazendo em relação ao assunto.
Acompanho seguidamente o blog e acho muito interessante os teus posts.
Deixo o meu para leres também.
www.ogritodarainha.blogspot.com
Abraço, Felipe Rosa.
Oi Luciana, concordo até certo ponto... Pode te sido mesmo precipitado o ato do "prefeito e cia" ter decretado situação de emergência na cidade antes de ter confirmações do casos de gripe A, mas mesmo com todo alarde feito nem todos estão preocupados. Ai q fica a pergunta,até onde q foi precipitação? Acredito que o "decreto" foi com a intenção de evitar mais casos e contaminações. O pânico que tomou conta de grande parte da população (inclusive eu) não foi geral e hj até fui motivo de deboche por estar usando máscara! Espero que as pessoas se conscientizem q embora digam na TV, jornais...q a gripe é inofensiva ela está matando centenas de pessoas mundo afora. TEmos que prevenir! Bjs
Não minimizo a preocupação das pessoas... Nem é algo contra as autoridades. Apenas uma crítica ao tom bélico ao se lidar com saúde. Tem gente comentando esse post em outros espaços. Adoraria debater aqui, mas enfim...
Não é nada contra o prefeito, mas contra o discurso ultrapassado que adota nesses momentos, e isso não é exclusividade dele.
Querida Luciana,
São Gabriel já é a cidade no Brasil com o maior numero de casos confirmados, tanto em numeros inteiros, como em numero percentual ao numero de habitantes. Se eu fosse o Prefeito, faria que nem o Alcaide da Cidade do Mexico fez: Tudo fechado por uma semana; mas como é mais facil criticar, com certeza se nada tivese sido feito, hj o prefeito seria acusado de omissão. Sem esquecer que seus dois filhos menores estao com o Virus (informaçao do próprio prefeito).
Se para o bem estar da populaçao os barzinho vao ficar vazios, paciencia minha querida.
Bjo e fique bem.
Anonimo, os números só são grandes porque estão considerando confirmados casos apenas suspeitos. A preocupação acho saudável, mas colocar as pessoas em pânico penso ser, sim, desnecessário. Não é proibindo o padre de rezar missa que vão controlar a situação. Minha modesta opinião!
Olá, Luciana...como vê, quem é vivo sempre aparece!
Acompanhei com atenção teus argumentos, mas penso num outro aspecto... o tipo de cobrança que haveria se a autoridade de Saúde não adotasse uma medida enérgica.
Vivemos numa cultura de Fronteira, onde séculos de predomínio oligárquico construíram uma relação paternal entre Poder Público e População. Não é herança deste ou daquele gestor, mas um traço cultural que, por acaso, conheces muito bem.
Passo também para deixar um convite: fiz um novo blog, intitulado "Sementes de Vitória". A bela resenha de uma bela e competente jornalista-com-diploma se encontra lá...
http://sementesdevitoria.blogspot.com/
Opiniões e discussões à parte, a doença está se disseminando pelo país. Não vejo a hora disso tudo acabar! Beijos Lu
Moreira, é uma satisfação sempre receber tua visita aqui no blog e poder interagir com o amigo, com seus argumentos sempre pertinentes. Concordo com relação às origens dessa cultura fronteiriça. Como disse, não é exclusividade desse ou daquele homem público. Na verdade é reflexo de um pensamento com arquétipos em nossas origens, realmente. Só que ao corresponder a essa ânsia paternalista com um decreto, não vejo muito sentido prático além de atrair a atenção da mídia e gerar pânico na população.
Sem mais, agradeço o convite e a publicação da resenha. Parabéns pelo livro!
REserva o meu exemplar!
Abração
Flávia, também me preocupo com esse vírus se espalhando e acho que a cobertura da mídia fica muito focada nos números deixando de lado os esclarecimentos. Assim, as pessoas ficam desesperadas, e impotentes.
Obrigada sempre pela visita. bj
Excelente seu texto, Luciana!
Lamentavelmente, como dizemos na linguagem do jornalismo esportivo, muitos políticos "jogam para a torcida" e esquecem que bom senso é o mínimo a ser considerado quando se toma decisões que afetam toda a coletividade.
Apesar de ser engraçada, foi muito boa a resposta do padre em mandar fazer os casamentos na prefeitura.
Pena que o prefeito de Itaqui também pense da mesma forma que o de São Gabriel e a já combalida saúde pública dos "pampas" tende a ficar ainda pior, já que muita gente que não tem a H1N1 vai acabar enchendo ainda mais os postos de saúde achando que está com a gripe.
Luciana, parabéns mais uma vez pelo seu blog. Eu acabei de chegar do Chile (onde o Temporão achou que era melhor ninguém ir) e a situação não me pareceu caótica. Os números confirmam que as pessoas que morrem com a doença são pessoas já debilitadas mesmo. No vôo de volta muitos brasileiros com máscara, numa histeria coletiva. Mas o engraçado era que muitos pais obrigavam os filhos a usarem as tais máscaras e não as colocavam.Mas se a situação é tão grave quanto parece, porque a anvisa não nos dá melhores esclarecimentos? Cheguei do Chile e faço o quê agora? aquele papelzinho que nos dão não diz muita coisa...Preciso tomar algum cuidado? por exemplo de não visitar crianças e pessoas debilitadas por algum tempo? pq o cara mal humorado da anvisa que nos atendeu nem me deu tempo de perguntar, pegou o meu questionário onde eu dizia que estava tossindo e chamou o próximo.Será que não era melhorar esclarecer do que simplesmente dizer para as pessoas não irem ao Chile?
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